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A próxima viagem será sempre a melhor

Você já se pegou pensando “A próxima viagem será sempre a melhor”? Quando foi a última vez que você literalmente parou para viver o momento de forma despreocupada? Na pauta de hoje, a nossa ansiedade pelo épico e a constante busca pelo melhor.

“A vida não é o que se viveu, mas sim o que se lembra e como se lembra dela.” (Gabriel Garcia Marquez)

A frase acima tem literalmente tudo a ver com o tema do post de hoje.

Depois de conversamos sobre a tal TPV e sobre expectativa versus realidade, é hora de bater um papo sobre a nossa constante busca pelo melhor, por vivenciar algo épico e o como isso nos afeta nas viagens.

Suíça
Você já se pegou em uma viagem já pensando na próxima? (Jungfrau, Suíça)

Se você, como eu, ama viajar, já se pegou com a ideia de que a melhor viagem será a próxima.

Ok, isso até pode parecer romântico como uma ideia de que você está sempre com aquela vontade de viver viajando, ou pelo menos com um bilhete aéreo ou as próximas férias programadas. Ótimo, quem não? Sonhar é o primeiro passo para realizar já diriam alguns.

Isso é super saudável se você encarar como um objetivo lá na frente a ser alcançado especialmente naqueles momentos mais difíceis ou entediantes do cotidiano. É quase que motivacional riscar os dias para as férias no calendário e sonhar com uma viagem. É quase que como aquela coisa do coelho correndo atrás da cenoura.

Mas e quando você passa a não mais curtir o “durante” da viagem como deveria porque já está pensando na próxima? Claro que o mesmo vale para qualquer outra coisa da vida, ok?

Hum, aí é que mora o problema.

Você curte o planejamento e preparativos, e na hora H… A cabeça sai da realidade e vai para a próxima viagem. Ai não é legal.

Conceitos prontos e frases de efeito nem sempre são aplicáveis, mas tem uma que realmente faz todo sentido quando o assunto é viagem: “viajar é algo que devemos curtir o antes, o durante e o depois”. Não sei quem foi o gênio que bolou este conceito, mas é preciso sempre lembrarmos dele para aproveitar com plenitude este delicioso ato de viajar aproveitando da melhor forma possível cada etapa.

O fator tempo e a inimiga ansiedade

Vocês já notaram como nos dias atuais vivemos literalmente o amanhã? Seja nos planejando boas realizações (viagem, casamento, novo emprego, filhos ou qualquer outra coisa boa), seja nos preocupamos com um problema que nem sequer bateu à nossa porta, cada vez mais vivemos fora do nosso tempo, ou no caso, num fuso horário à frente do nosso.

Às vezes o ritmo de vida que levamos, a quantidade de informações às quais temos acesso fácil, cobranças e preocupações que todos nós temos podem nos levar a este quadro. Mas será que isso é saudável?

Deserto de Wadi Rum
Precisamos parar e apreciar o momento mais vezes, nem que seja nas férias!

Dizem que a ansiedade é um dos principais males que afetam a nossa mente nos dias de hoje. O outro, segundo os especialistas é a depressão.

Ah, mas eu não sou nada ansioso. Será mesmo?

Pare e faça uma breve auto-analise: você se dá alguma vez direito a um ócio completo? Hoje, parecemos estar o tempo todo tentando aproveitar cada segundo para fazer algo produtivo. Nem mesmo para ir ao banheiro largamos o celular. Ops, desculpa ai se você está agora justamente nesta situação, mas é verdade!

Mas refletindo isso nas viagens, muitas vezes nós não paramos para prestar a devida atenção e aproveitar um determinado momento de contemplação de forma plena. Não, não estou sugerindo que você fique horas olhando para uma paisagem qualquer ou seja um slow traveller. Mas acho que bastam alguns bons minutos de qualidade para realizar-se e aproveitar ao menos um pouco o instante ao invés de pensar “o que virá a seguir?”.

A busca pelo melhor, pelo épico

A cada dia, minuto ou segundo nós estamos constantemente buscando melhorar as coisas. Sejam coisas pequenas, sejam aqueles sonhos megalomaníacos, sempre estamos em busca do melhor.

Esta constante busca do melhor não só é natural como também faz parte da natureza evolutiva do ser humano e é o que nos move a diante.

Ninguém, salvo uma necessidade alheia à sua vontade, planeja mudar para pior. Você conhece alguém que tendo um bilhete de executiva fale “ah, hoje vou lá para trás na econômica”, ou “vou trocar este quarto com vista para o mar para um com vista para uma parede”.

Maldivas
Já viu alguém trocar um hotel top assim por um inferior por livre espontânea vontade?

Não orna!

É fato, o ser humano está sempre em busca do melhor. É o que nos move a diante.

Esta busca do melhor só torna-se prejudicial quando ela traz consigo dois problemas.

O primeiro é que nesta busca incessante pelo melhor, pelo épico, a pessoa pode deixar de viver o presente.

Vamos combinar que quando você abre o Instagram, cito ela porque na época deste post é a rede social com maior impacto visual e consequentemente a mais popular para quem curte viagem, a primeira coisa que você quer é viver uma aventura ou conhecer um lugar fantástico.

Logo vem aquele sentimento: “Nossa, eu queria estar lá!”.

Tanto que as fotos mais curtidas são de pessoas em lugares e não apenas de destinos de viagem.

Esta questão do épico é usada pelo marketing faz tempo.

Muitos anos atrás, a GoPro foi lançada com a promessa (inconsciente é claro!) de que todos teriam momentos épicos para serem capturados pela versátil câmera. #SQN.

Bungy Jump
Um momento GoPro na vida real. Mas nem sempre é assim…

Gera-se uma expectativa exacerbada sobre as coisas e uma obrigação de que todos sejam felizes e eufóricos o tempo todo.

Na real, a vida é uma montanha russa, com altos e baixos. Tem dias de sol e de chuva, e temos que tentar aproveitar todos eles da melhor forma possível. Nem que seja para tirar deles, valiosas lições.

Dias atrás ouvi um conceito muito interessante: você não é feliz, você está feliz. A felicidade é um estado momentâneo e efêmero.

Não temos como negar que as pessoas vivem uma espécie de obrigação pelo épico e a busca constante por grandes emoções e experiências. Não estou aqui julgando não, apenas propondo uma reflexão.

Na atualidade, nos entediamos com uma enorme facilidade. Trocamos o tédio pela ansiedade e corremos o risco de nunca estarmos satisfeitos.

Já o segundo aparece quando analisamos a ideia de melhor para quem? Melhor segundo que?

Deixa-se passar outras coisas que podem ser igualmente interessantes.

Mas o que é melhor de verdade? Existe mesmo algo que seja imperdível?

Muralha da China.
Muralha da China.

Hoje em dia vivemos o mundo dos rankings. É top isso, melhores aquilo e por ai vai. Ok, eu também tenho os meus rankings de melhor praia do mundo, melhor sorvete do mundo e tal, mas deixo sempre claro que é algo pessoal.

Basta abrir a internet ou sites como por exemplo o TripAdvisor para vermos uma profusão enorme de listas de melhores isso ou aquilo.

Mas o que é de fato melhor? Melhor para quem? Melhor segundo quais critérios?

Experimente montar um roteiro de viagem e compartilhar com um alguém que já tenha ido para o destino (isso é sempre bom!), ou até mesmo ler um blog de viagem. Muito provavelmente você ouça e leia comentários e dicas do tipo: “isso é imperdível” ou “esta atração é essencial”.

Ok, quem escreve blogs ou simplesmente curte dar dicas mais informais tem uma tendência humana de adjetivar assim as coisas não para te criar uma obrigação não. A ideia é apenas a de mostrar com mais ênfase o quanto algo é interessante. É algo do tipo “fui e adorei”. Afinal, quem busca este tipo de coisa quer informação e opinião.

Até porque viajar demanda duas coisas que estimamos bastante (tempo e dinheiro), não queremos perder as chances de melhor aproveitar a viagem e curtir ao máximo os nossos momentos épicos, e muitas vezes nos vemos na obrigação pessoal de conhecer isso ou aquilo, nem tanto porque é o nosso gosto, mas sim porque alguém convencionou que é essencial.

Em resumo viaje e veja o que lhe interessa. Afinal, ninguém tem obrigação de ir para Paris e passar horas no Louvre se não curte arte. Combinado?

O mais doido é que muito provavelmente ao final da viagem, as suas lembranças mais vívidas não serão daquela super atração, mas sim de coisas aparentemente banais que não estão em nenhum guia ou blog de viagem.

Canguru Austrália
Às vezes as melhores lembranças de uma viagem são momentos menos épicos.

O nosso cérebro é algo super complexo.

Você planeja passeios a lugares fantásticos para ver aquela famosa paisagem, mas no final e não raras vezes, as lembranças mais vívidas que ficam são de coisas simples, como um doce, um cheiro, uma conversa com um local, ou até mesmo uma rua mais charmosa que não estava em nenhum roteiro.

Isso acontece muito comigo. Às vezes lembro de uns detalhes de viagem (aparentemente) nada a ver, mas que estão super vividos.

Minha dica diante de tudo isso? Às vezes é preciso desligar-se de algumas obrigações e principalmente abrir espaço e a mente para o fora do roteiro.

Olhando todas estas ideias, acho que dá para concluir que o único lugar em que a ideia de que “a próxima viagem será sempre a melhor” tem cabimento saudável é quando você olha para si mesmo, já que quanto mais você viaja, melhor viajante você se torna! Ai sim, como diz aquele filme do 007, The World Is Not Enough (O mundo não é o bastante).

Boas Viagens!

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2 comentários

Denise 14 de dezembro de 2019 at 21:31

Texto perfeito! Minha melhor lembrança de uma viagem a Londres foi o risoto maravilhoso q comemos sentados na calçada em Covent Garden, comprado por acaso em um food truck. Claro q gostamos muito de visitar os museus e diversos pontos turísticos. Mas aquele cheirinho não sai de nossa lembrança!

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Diogo Avila 14 de dezembro de 2019 at 22:25

É Denise, às vezes as melhores experiências estão nas menores coisas.
Boas Viagens!!!

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